LiteraLivre Vl. 5 - nº 30 – Nov./Dez. de 2021
Reinaldo da Silva Fernandes Brumadinho/MG
Paixão de uma vida Inteira — Pai, o Lula é o 13? – gritou lá de dentro da cabine de votação. A presidenta da seção eleitoral fez aquela cara de quem não sabia o que fazer, no que foi seguida pelo pai que a olhava em busca de socorro. Ele o acompanhara e estava à porta da seção, com uma fila quilométrica naquela hora do dia. Como a presidenta não se decidia, por xingar ou por autorizar a resposta, ele arriscou, meio tímido: — É, filho, Lula é o 13. Segundos depois o pai ouviu o “tlin, tlin, tlin, tlin, tlin” da urna após o “CONFIRMA”. O menino saiu de trás da cabine e correu para abraçar o pai, como se acabasse de realizar uma grande façanha, vencer uma São Silvestre, ganhar sozinho na Mega-Sena da virada ou receber o título de “Doutor”. O “menino” completara 18 anos. Mas continuava um menino. Os olhos oblíquos, num rosto arredondado, circulado por cabelos pretos, lisos, repartidos do lado, a franja quase chegando aos olhos, meio gordinho. Não passava de 1,65 m, com certeza. O pai o recebeu com um sorriso maior ainda, cheio de amor. Os olhos – do pai - brilhavam um brilho que não pude entender se só de amor ou se
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mesclado com certa angústia – feito um Luis da Silva, de Graciliano -, certa incerteza no futuro. “É Lula! É Lula! É Lula”, pôs-se a gritar o menino. O pai abraçado a ele, meio desconcertado, olhava o olhar da presidenta da seção, como a dizer: “Não tenho culpa, ele é assim!” — Diz a ele que não pode fazer boca-de-urna aqui, interpelou o 1º mesário da seção, este já parecendo menos compreensivo do que a presidenta, cara fechada de autoridade. Enquanto ordenava, o mesário estendeu a mão ao pai para entregar o comprovante de votação que o menino, eufórico ao cruzar a linha de chegada da São Silvestre, não se preocupara em pegar. Ele, pendurado no pescoço do pai, feliz feito eu em dia de chuva; o pai, com aquele sorriso orgulhoso de quem bate no peito e diz: “É meu filho!”, generoso na tonicidade do “meu”. O menino era sempre assim: diferente. Não tinha apenas cromossomos a mais em cada célula, tinha amor a mais em cada célula, carinho a mais em cada célula, sorriso a mais, leveza a mais. Inocência demais. Pureza.