LiteraLivre Vl. 5 - nº 30 – Nov./Dez. de 2021
Valéria Vanda Xavier Nunes Campina Grande/PB
Sonho de uma tarde de verão Clarice não cabia em si de felicidade naquela tarde esplêndida de verão. Acabava de receber uma carta que há meses esperava com ansiedade. O remetente: Ballet Bolshoi - Joinville. Santa Catarina. O coração bate acelerado. Aceita. Em meio às outras, essa era a única palavra que não saía de sua mente. Sentou-se no sofazinho já bastante gasto e sua mente viajou no tempo. Viu-se menina ainda, com a mão esticada segurando a barra que o pai havia colocado na parede sem reboco de sua casa onde treinava sozinha e fazia suas piruetas em plena rua esburacada. Dona Letícia emocionou-se ao chegar na favela em que Clarice morava para fazer doações de cestas básicas para a comunidade e seu olhos se encontraram com os daquela menina dançando ballet em plena rua. Avaliou seu potencial. Seus olhos marejaram lembrando do desejo da filha que também sonhara em ser bailarina e teve um destino tão trágico antes de conseguir realizá-lo. Letícia era dona de uma escola de ballet para meninas carentes que criou em homenagem à filha amada e falecida. Clarice não sabia ainda, mas aquela mulher, a partir daquele momento, seria sua fada-madrinha e
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mudaria totalmente o rumo de sua vida. Ouve a voz da mulher a suas costas e vira-se num belo rodopio. — Então a menina gosta de dançar. Qual é o seu nome? — Letícia pergunta olhando forte nos olhos de Clarice que baixa os seus e responde, encabulada. — Clarice. Eu gosto muito de dançar, sim senhora. — E você faz aula de balé? — Faço não, senhora. Meus pais não podem pagar. — E você gostaria de fazer? — É o meu maior sonho, senhora, mas meus pais nunca que iam deixar, pois a gente não tem dinheiro. É muito caro. Por isso eu danço sozinha aqui. — Clarice responde ainda com os olhos baixos e segurando-se na barra numa linda pose. Letícia enche os olhos de lágrimas mais uma vez, mas consegue se controlar. Pega na mão da menina e diz que quer falar com sua mãe. Clarice sai do enlevo em que caiu e segura a emoção ao lembrarse da primeira vez que entrou na escola de ballet pelas mãos de dona