O cálice de ágata é muito bonito e dá glória a Deus. Uma das glórias que ele dá é de ter produzido numa criatura humana superior a ele a impressão que ele produziu. E o homem que se deleita com a ágata dá mais glória a Deus do que a própria ágata da qual ele recebeu o efeito. Olhar para mim, e ver-me enquanto consonante com a ágata, e num movimento reto da minha alma consonando com aquela ágata. E dizer: “Deus, quando contemplou essa ágata depois de criá-la, teve também consonância. Dois seres consonantes com um terceiro são consonantes entre si. Deus foi consonante com esta ágata; eu sou consonante com essa ágata; nesse momento, eu sou um pouco consonante com Deus”. E aí se estabelece uma vinculação que me faz ter encanto com a ágata294. As canduras de uma alma inocente Um dado a se fazer notar era o jogo das precocidades e dos retardamentos, jogo esse especial dentro de minha alma, e que não era precisamente o jogo que se notava nos meninos do meu tempo. Eu era, por certo ângulo, mais cândido e mais inocente do que eram eles, no sentido próprio da palavra, o que me levava a não perceber na vida concreta e no mundo concreto uma porção de coisas que eles percebiam. Não estou aludindo aqui a assunto sexual; estou me referindo à época em que eu era tão menino que o assunto nem se punha. Por exemplo, no caso do Guignol de Paris295, as minhas intervenções eram feitas sem eu ter a menor ideia de que aquilo estava repercutindo no público. E quando eu notava a repercussão, eu também não tinha a menor ideia de que essa repercussão fazia de mim um menino diferente dos outros. Eu me julgava uma criança qualquer, e assim como eu estava falando com aquele homem do Guignol, eu falaria com meninos que estivessem brincando comigo. Eu notava que eles riam, mas eu não notava que havia um subentendido naquilo. Outra coisa: não tinha ideia muito clara da separação entre o palco e o público. O público tomava parte no drama do palco e eram torcedores, mas quase marionetes eles mesmos dentro do palco. Não vinha ao meu espírito 294 SD 9/6/79 295 MNF 17/11/94 – Dr. Plinio se refere aqui às suas idas, na sua viagem à Europa quando criança, ao teatro de marionetes do Bois de Boulogne, chamado Guignol. Na inocência de seus 4 anos, ele atribuía certa realidade à cena que estava se passando no palco. E quando não estava de acordo com a evolução da peça, ele intervinha, sempre num sentido contra-revolucionário. 1ª PARTE – O MENINO PLINIO 141